Leão XIV: O Papa que une as Américas e herda o espírito reformador de Francisco

Eleito como primeiro Papa nascido nos Estados Unidos, Robert Francis Prevost surpreende o mundo ao assumir o trono de Pedro com um forte laço à América Latina e à tradição agostiniana — e promete dar continuidade às reformas de Francisco com olhar voltado aos excluídos.
Por CRISTIANO MEDINA, bacharel em direito
MARABÁ (PA) – A fumaça branca anunciou mais do que a escolha de um novo pontífice: revelou ao mundo a continuidade de um projeto. Ao ser eleito Papa no segundo dia de conclave, com apenas quatro votações, o cardeal norte-americano Robert Francis Prevost, de 69 anos, tornou-se o novo líder da Igreja Católica, adotando o nome de Leão XIV. Uma escolha que sinaliza tanto ruptura quanto continuidade — e que carrega simbolismos profundos.
O novo Papa, embora nascido em Chicago (EUA), é fruto de uma trajetória marcada pela vivência na América Latina, especialmente no Peru, onde foi missionário, professor, juiz e bispo. Sua relação com o continente sul-americano transcende o currículo: é parte de sua identidade. “Sou americano, sim, mas latino de coração e vocação”, disse em espanhol durante seu discurso inaugural, no qual também reconheceu sua cidadania peruana.
Um Papa entre Santo Agostinho, Leão XIII e Francisco
Leão XIV pertence à ordem dos Agostinianos, e sua formação intelectual é profunda e marcante. Doutor em Direito Canônico pela Universidade de São Tomás de Aquino, ele traz na bagagem a tradição filosófica de Santo Agostinho, o olhar social de Leão XIII e a prática pastoral de Francisco.
A escolha do nome Leão XIV é um gesto carregado de simbolismo. Leão XIII, Papa entre 1878 e 1903, foi o autor da histórica encíclica Rerum Novarum (1891), considerada o marco inicial da Doutrina Social da Igreja. Seu pontificado buscou o equilíbrio entre tradição e modernidade, denunciando as injustiças sociais da Revolução Industrial. Agora, Leão XIV promete ecoar esse espírito, mas nos desafios do século XXI.
Assim como Francisco, Leão XIV propõe uma “Igreja em saída”, voltada para as periferias geográficas e existenciais. Sua primeira benção Urbi et Orbi já demonstrou esse compromisso: falou de sinodalidade, de paz, de pontes de diálogo — e agradeceu diretamente ao Papa Emérito Francisco, cujo legado assume como continuidade.

Discreto, reformador e global
A eleição de Prevost foi uma surpresa até mesmo para observadores do Vaticano. Reservado e fluente em cinco idiomas, ele manteve uma postura discreta mesmo ocupando posições centrais na Cúria Romana. Desde 2023, como prefeito do Dicastério para os Bispos, foi peça-chave na seleção de lideranças episcopais em todo o mundo.
Sua atuação firme, porém serena, contrastou com nomes mais midiáticos do último conclave. E talvez por isso mesmo tenha sido escolhido: um reformador com profundidade intelectual, mas sem estridência. Um tradicionalista no sentido autêntico: fiel à essência, mas atento aos sinais dos tempos.
Compromisso com os excluídos
Um dos pontos mais fortes do novo Papa é sua atenção às causas sociais. Ele tem se posicionado abertamente contra políticas anti-imigração e conservadorismos radicais. Em diversas ocasiões, criticou a indiferença diante da crise migratória e se colocou ao lado dos pobres, refugiados e povos marginalizados.
Seu pontificado promete reforçar o papel da Igreja como voz profética em defesa da justiça social. Não à toa, sua escolha gerou esperança não apenas entre os fiéis do hemisfério sul, mas também entre os setores da Igreja que defendem reformas, abertura e acolhimento.

O que esperar de Leão XIV
Com base em sua trajetória, tudo indica que Leão XIV dará continuidade à agenda de reformas iniciada por Francisco: mais participação leiga, descentralização do poder, sinodalidade e foco nas periferias. Mas o fará com o tom sereno de um acadêmico agostiniano, equilibrando tradição e renovação.
A eleição de um Papa das Américas — e das duas Américas — é um marco na história da Igreja. Ela reconhece a vitalidade e diversidade do catolicismo no continente com maior número de fiéis do mundo, e reforça um novo centro de gravidade espiritual fora da Europa.
Leão XIV não é apenas o sucessor de Pedro, mas o herdeiro espiritual de Francisco e Leão XIII. Um Papa que chega com raízes profundas, olhos atentos e coração voltado ao povo.